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"Estou muito contente por ir ao Masters. Espero representar bem o Brasil"
Carlos Bernardes


Ao 36 anos, o paulista Carlos Bernardes é hoje um dos maiores árbitros do Brasil e do mundo. Após mais de uma década de carreira, foi chamado pela primeira vez para integrar a equipe da Masters Cup, torneio que reúne apenas os melhores tenistas da temporada. Na entrevista especial para Tenisbr@sil, Bernardes conta um pouco de suas histórias no esporte, desde a época que começou até os dias de hoje. Na última semana, ele participou do Visa Tennis Open, no Clube Paineiras, que ao lado do Brasil Open é apenas um dos dois torneios que faz em casa.

Por Elói Silveira
Como foi o começo de carreira, como você se interessou e chegou ao tênis?
Carlos Bernardes - Por volta de 88, 89 eu ainda dava aula de tênis e houve um torneio no Pinheiros, a Federation Cup. Eles colocaram anúncio no jornal dizendo que precisavam de 120 juízes de linha. Falei com minha chefe (dava aula em São Caetano) e acabamos indo só dar uma olhada. Fomos selecionados, trabalhei uma semana e gostei. Depois me convidaram para fazer outros torneios no interior e, como houve uma explosão dos torneios por aqui, com muitos Grand Prix e challengers, comecei a viajar mais. Tive que tomar uma decisão das mais difíceis, porque acabei largando uma profissão segura em troca de uma coisa que eu não sabia se ia dar certo ou não.
Você tinha interesse ou ele só começou a crescer na hora em que se envolveu definitivamente?
Carlos Bernardes - Não tinha interesse em ser árbitro de tênis. Foi só uma curiosidade e que passou a ser uma profissão hoje. E não me arrependo da opção. Tanto que nos anos seguintes tive a oportunidade de ir para os EUA, que é até hoje o ponto de partida para um árbitro se ele quer seguir carreira, para fazer o Lipton (hoje o Masters Series de Miami). Foi muito importante.
Nessa época você já falava outras línguas? Em quantos idiomas você precisa ser fluente para trabalhar como juiz?
Carlos Bernardes - Não, não sabia falar quase nada. E temos algumas histórias até engraçadas dessa época. Como uma vez em Miami mesmo. Não tinha sabonete no hotel e o outro árbitro ligou para pedir na recepção. Mas em vez de ele pedir ‘soap’ (sabonete em inglês), ele falava ‘soup’ (sopa). Depois de uns 20 minutos, a campainha tocou, eu atendi de toalha e vi que era o rapaz do hotel com um carrinho e quatro bandejas de sopa. Passaram a semana toda brincando com a gente.
E foi difícil começar sem saber o inglês?
Carlos Bernardes - Foi sim, você precisa saber inglês. Porque o jogador, mesmo que seja da Alemanha, tem que falar com você em inglês. E se um dos dois não souber, não vai haver comunicação. Por exemplo, se ele pede alguma coisa e você não sabe resolver, acaba ficando em situação ruim.
O que alguém que quer começar na carreira precisa além de saber falar inglês e, talvez, de sorte?
Carlos Bernardes - Na minha época aconteceu assim e, por incrível que pareça, hoje é preciso ter muita sorte. Antigamente ser árbitro não era uma profissão reconhecida, mas hoje é. E há pessoas do mundo inteiro se interessando. Mas como em qualquer lugar existe um número limitado de vagas. E você precisa ter sorte, estar perto de onde acontecem as coisas, precisa estar no torneio certo com as pessoas certas. De repente você é conceituado, competente, mas por morar longe você não consegue entrar.
Por ser brasileiro, apesar de ter ido logo cedo para os EUA, sofreu algum preconceito?
Carlos Bernardes - Não, não existiu isso. O que a gente acaba enfrentando é mesmo a sorte de estar no lugar certo, na hora certa, fazer os jogos certos. Houve vários árbitros de regiões centrais, como Alemanha e outros da Europa, que tiveram a mesma chance e não aproveitaram, ou tiveram azar de ter um problema e foram queimados nesse caminho. De repente se fosse uma coisa mais lógica, se não tivessem feito aquele jogo difícil tão rápido eles ainda estariam bem. Em alguns torneios cheguei a fazer jogos que não sei se estava preparado, mas fiz bem e sei que dei um passo bem grande.
Como a ATP divide o quadro de árbitros? Não dá simplesmente para dizer ‘pronto, vou ser árbitro’, você tem que estar na ATP...
Carlos Bernardes - Existem duas identidades, a ITF (Federação Internacional) e a ATP. A ATP tem um grupo de oito árbitros, os "full-time", um segundo grupo em desenvolvimento, com mais oito árbitros, e um terceiro grupo que trabalha com challengers. A ITF tem um outro grupo "full-time" com um total de seis juízes e outros 10 que trabalham em torneios pequenos. Se contar tudo, dá mais ou menos 40 ou 50 para fazer a maioria dos torneios do mundo. A ATP garante para os principais grupos um determinado número de semanas por ano e esses árbitros sabem no final do ano quantas semanas vão fazer na temporada seguinte.
E você pode escolher os torneios que você quer? Grand Slam se escolhe, por exemplo?
Carlos Bernardes - Não. Você faz um pedido e a organização escolhe os que querem pegar. Você manda sua solicitação, eles olham quantos árbitros de determinada categoria (gold, silver, bronze e o white) precisam e, conforme os nomes, eles te selecionam.
Dá para viver bem como árbitro?
Carlos Bernardes - No começo foi difícil, até pagávamos para trabalhar. Mas com o passar do tempo você é designado para torneios que te pagam tudo, hospedagem, passagem, alimentação. O tempo que passa entre o início até ficar tranqüilo varia com aquele negócio da sorte. Conheço árbitros que começaram comigo e que hoje ainda estão na fase de ter que pagar avião, hotel. Mas hoje não posso reclamar. Não ganho como os tenistas, infelizmente. Mas não me arrependo.
Fazendo uma comparação, árbitro de tênis sofre tanto quanto de futebol?
Carlos Bernardes - Não, graças a Deus (risos). É diferente, são no máximo quatro jogadores (nas duplas) e eles respeitam mais que no futebol. E no tênis não existe o contato físico.
Mas você já passou por uma situação difícil dentro de quadra?
Carlos Bernardes - Algumas vezes. Uma situação ruim aconteceu numa Copa Davis, no Chile, com a Argentina. As partidas tiveram que ser suspensas, houve "guerra de cadeiras" e algumas pessoas se feriram. Foi assustador. Mas no geral, como fazemos muitas partidas por ano, dá para passar por cima disso.
Quantas partidas mais ou menos por ano você faz?
Carlos Bernardes - De 300 a 400, dependendo do calendário.
E tem alguma que te marcou na carreira?
Carlos Bernardes - Sim. Gosto muito de uma partida que fiz em Split, em 99, entre Boris Becker e Goran Ivanisevic. O Becker ainda tava voltando e não era cabeça-de-chave, mas mesmo assim era entre dois dos melhores tenistas do mundo. Foi um jogo espetacular, com três sets, dois em tie-breaks.
E o Ivanisevic confirma aquela fama de dar sempre problemas?
Carlos Bernardes - Não, não são os jogadores. Claro que tem um mais explosivo que o outro, mas são as situações que acontecem na quadra é que muda a cabeça deles.
Mas existe algum jogador que fica marcado entre os árbitros, como o Marcelo Ríos, por exemplo?
Carlos Bernardes - Dentro de quadra não acontece isso, no caso dele é mais pelas declarações, atitudes. Vocês (jornalistas) conhecem os jogadores de uma forma, a gente conhece de outra. Às vezes pode pensar que o cara é um "pentelho", mas de repente é na quadra que ele se transforma. E tudo que acontece tem que morrer na quadra, não pode levar para o lado pessoal.
Esse ano você está indo para o Masters pela primeira vez. O que significa isso para você?
Carlos Bernardes - É como um sonho. Quando você segue uma carreira você sempre quer alcançar os degraus mais altos. E ir para o Masters é realizar mais um sonho dentro da carreira. Estou muito contente por ter sido selecionado. Eles me avisaram no meio do ano, um pouquinho depois do US Open. Espero representar bem a ATP, o Brasil, já que infelizmente não vamos ter tenistas por lá.
Quantos Grand Slam você já participou?
Carlos Bernardes - Os únicos que nunca fiz foram Wimbledon e Austrália. Já fiz Roland Garros uns quatro anos e US Open uns nove seguidos. Nunca fiz Wimbledon porque tenho problemas de calendário, mas vou tentar pela primeira vez no ano que vem. Vamos ver.
Tem algum torneio especial no circuito?
Carlos Bernardes - Roland Garros, sem dúvida. Pelo público, pelas partidas sendo jogadas em saibro, mais longas, dá para ver mais a plasticidade do tênis. É muito interessante.

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